A Ópera do Malandro nos Negócios: Brincando de Roleta Russa

(por Raúl Candeloro )

Uma coisa pouco comentada no mundo dos negócios é que as características do empreendedor de sucesso são uma faca de dois gumes.

Se misturarmos uma certa dose de iniciativa com inteligência, autoconfiança, motivação, criatividade, habilidades interpessoais e uma boa dose de ambição, temos também todas as características de um bom malandro.

O problema é viver nesse limite: com centenas, às vezes milhares de reais passando diariamente pela sua mão, muitos empreendedores, empresários ou consultores ficam tentados a usar de artifícios escusos para se apoderar indevidamente de uma parte daquele dinheiro.

Em empresas onde o profissional não é remunerado adequadamente, ou não é tratado adequadamente (geralmente por problemas internos de comunicação), muitos pensam: "para que vou trabalhar mais? Só para deixar meu chefe (ou patrão) ainda mais rico? Vou é garantir o meu".

A lógica é tem tanto que se eu tirar só um pouquinho ninguém vai notar. É mais ou menos a lógica dos políticos corruptos - racionalizam sua desonestidade com frases como 'se eu não fizer, alguém vai fazer', 'todo mundo faz mesmo', 'vou tirar só um pouco e depois paro', 'tenho que aproveitar para fazer meu pé de meia', etc.

Mas o pior é que não param nada - ficam como aqueles alcóolatras que só admitem seu problema depois que a sua vida se desintegra. Às vezes nem assim. Destróem a si mesmos e tudo à sua volta.

Um bom empreendedor, assim como o malandro, vê um mundo repleto de oportunidades - um mundo cheio de riquezas e de chances. Ao contrário dos perdedores, que olham e só vêem a parte ruim. Isso o estimula o vendedor a querer pegar um pouquinho para ele. Se fizer isso corretamente, será uma pessoa de sucesso. Se não... mais um picareta denegrindo a imagem dos empresários.

Aqui entra justamente a diferença entre um bom profissional e o malandro: o profissional entende que o sucesso a longo prazo só pode ocorrer se seus clientes forem também um sucesso. Entendem que enganar alguém pode até dar lucro a curto prazo, mas em pouco tempo sua fama de picareta se espalha e daqui a pouco tem que mudar de cliente, de empresa ou de cidade (de novo).

Qualquer análise de pessoas bem-sucedidas, principalmente nos dias de hoje, acaba inevitavelmente mostrando pessoas dedicadas 100% ao que fazem. Com juízes presos, senadores cassados, Receita Federal atuante e outros exemplos claros de mudanças sociais, está claro que o Brasil mudou e a malandragem é cada vez menos lucrativa.

Infelizmente, muitas empresas ainda insistem em tampar os olhos ou, pior, estimular a desonestidade (ou quase desonestidade) da sua equipe, dando maus exemplos e respondendo coisas como "feche o negócio e depois a gente vê" quando perguntados sobre problemas éticos. Ou o famoso 'faça o que tiver que fazer mas não me conte'.

Essas histórias sempre acabam mal. Os malandros acabam sempre querendo fazer negócios maiores, dar as famosas 'tacadas', encher o bucho de dinheiro, lavar a égua, etc. Acabam perdendo clientes, sendo demitidos, quando não presos.

Anos atrás fizemos uma pesquisa sobre Ética em Vendas - começou com esse título mas no final era uma pesquisa de Falta de Ética em Vendas. Gente que fala mal dos concorrentes, que faz propaganda enganosa, que vende sem nota - uma série de comportamentos anti-éticos que beneficiam no curto prazo o autor da falta, mas que são altamente destrutivos com o passar do tempo.

Existe uma visão cretina no Brasil de que só se fica rico roubando, de que pobre não tem chance. Uma visão burra e imediatista que não estimula corretamente o estudo, a consistência, o longo prazo. Tudo tem que ser agora, desesperadamente rápido. Nada mais poderia estar longe da verdade. Um sucesso da noite para o dia leva anos para ser construído.

O Brasil tem uma mobilidade social imensa: quem pode dizer que está hoje, financeiramente, pior do que seus pais estavam quando tinham sua mesma idade? Visto dessa forma, pouquíssima gente piorou - mas somos imediatistas e queremos tudo agora. Para alguns a tentação é tão grande que qualquer coisa justifica saciar sua ambição.

Se você quer atingir seus objetivos na vida, a primeira coisa que tem a fazer é decidir quais são esses objetivos. Malandros são pessoas profundamente egoístas: querem ter alguma coisa que não tem, mas não querem pagar o preço. Então usam o famoso 'jeitinho'. Às vezes conseguem. Na maioria das vezes não. De qualquer forma, uma hora serão pegos. Mas a maioria prefere apostar: tudo bem, posso até ser pego, mas até lá viverei perigosamente. Depois choram na frente da TV.

O sucesso nos negócios não tem atalho: você tem que ajudar os outros a resolverem seus problemas, e aí sim ser adequadamente remunerado por isso. Faça isso com consistência e, além de ganhar dinheiro, terá um dos maiores valores que alguém pode ter: uma boa reputação e a segurança de poder dormir tranqüilo. E poder gastar seu dinheiro sem ter que ficar se preocupando ou dando explicações.

Existe um jogo suicida chamado 'roleta russa', onde uma pessoa roda o tambor com uma bala dentro, coloca contra a cabeça e aperta o gatilho. É exatamente o que faz o malandro com sua vida. Às vezes não acontece nada. Mas uma hora acontece.

E você: conhece algum malandro jogando roleta russa?

Raúl Candeloro (www.raulcandeloro.com.br), é palestrante e editor da revista VendaMais®, além de autor dos livros Venda Mais e Negócio Fechado e responsável pelo site VendaMais® (www.vendamais.com.br).

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