Gestão do conhecimento é uma tarefa possível? 

(por André Ferrari)

 

Fernando Culto finalizou mais um dia de trabalho. Tirou os óculos e esfregou os olhos enquanto pensava no relatório que acabava de terminar. Juntou as faturas espalhadas pela mesa e guardou-as na gaveta. Pegou o paletó, estatelado no encosto da cadeira, e saiu de sua sala. Já no elevador lembrou de deixar seu conhecimento. Voltou imediatamente, abriu a gaveta e deixou tão valioso ativo. Claro, não esqueceu de trancar a gaveta; Culto sabia a importância daquele bem.

 

Esse é o sonho de toda empresa! Já pensou se todos os funcionários, do faxineiro ao presidente, deixassem seus conhecimentos na empresa antes de irem para casa. Imagino que toda empresa teria um cofre com divisões para cada funcionário deixar sua experiência acumulada. Que loucura não seria a manchete “Matriz do Bradesco é assaltada! Bandidos deixam milhões e só levam o compartimento onde estava o conhecimento do presidente”. Felizmente não é assim...

 

A mídia passa por fases. O assunto predileto no momento é a gestão do conhecimento. Discute-se o conhecimento como ativo principal de uma organização. Inventaram até um novo conceito de capital, com um novo valor, um novo conceito de riqueza: o capital intelectual. Os adoradores do modismo usam sociedade da informação, sociedade do saber, sociedade do conhecimento... e por aí vai. Quero colocar panos frios nessa história! O assunto não é tão simples quanto parece. Na sociedade da informação, gerir o conhecimento é o grande desafio de uma organização e que está ainda muito longe de ser alcançado.

 

Vejo o conhecimento em duas dimensões: uma tangível, visível e outra intangível. A dimensão tangível do conhecimento é aquela que pode ser codificada, manipulada, traduzida em manuais, rotinas, regimentos, regras. Este conhecimento – não tenho dúvidas – vem sendo gerido pelas mais modernas técnicas de gestão, nas quais a TI(Tecnologia da Informação) assume papel precípuo. Tal conhecimento, dito explícito, assume forma de modelos de relatórios, modelos de vendas, fluxo de informações, procedimentos, técnicas de atendimento e pode ser facilmente manipulado. Mas esse conhecimento é somente a ponta do Iceberg. Todo o resto é conhecimento tácito, muito mais importante para a organização e, conseqüentemente, mais difícil de ser administrado e retido. O conhecimento tácito são os valores pessoais, as perspectivas, a criatividade, o poder de filtrar uma informação para tomada de decisão, enfim, é cada elemento da experiência acumulada ao longo dos anos. Esse é o conhecimento que importa para as organizações, o conhecimento que agrega valor. O conhecimento explícito pode ser rapidamente absorvido por outra pessoa, mas não o conhecimento tácito.

 

Portanto, a gestão do conhecimento ainda tem muito que evoluir.  O grande desafio acometido às organizações é transformar o conhecimento tácito, os modelos mentais em modelos palpáveis e habilidades técnicas capazes de serem compreendidos por outros colaboradores da empresa. No meu entender isso ainda não é 100% possível. O conhecimento tácito não pertence à organização e cabe a ela fomentar boas práticas de disseminação e do uso deste conhecimento intangível. Fazer com que os “Fernandos Cultos” compartilhem seu conhecimento, esse sim é o caminho que a gestão do conhecimento deve seguir.

  

André Ferrari é diretor do Grupo Relacione-se e palestrante.

Site: www.relacione-se.com.br

Email: ferrari@relacione-se.com.br

 

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